segunda-feira, 5 de novembro de 2007

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"Você sabe que de alguma maneira a coisa esteve ali, bem próxima. Que você podia tê-la tocado. Você poderia tê-la apanhado. No ar, que nem uma fruta. Aí volta o soco. E sem entender, você então pára e pergunta alguma coisa assim: mas de quem foi o erro?

(...)

Você vai perguntar: mas houve o erro? Bem, não sei se a palavra exata é essa, erro. Mas estava ali, tão completamente ali, você me entende? No segundo seguinte, você ia tocá-la, você ia tê-la. Era tão. Tão imediata. Tão agora. Tão já. E não era. Meu Deus, não era. Foi você que errou? Foi você que não soube fazer o movimento correto? O movimento perfeito, tinha que ser um movimento perfeito. Talvez tenha mostrado demasiada ansiedade, eu penso. E a coisa se assustou então. Como se fosse uma coisa madura, à espera de ser colhida. É assim que eu vejo ela, às vezes. Como uma coisa parada, à espera de ser colhida por alguém que é exatamente você.


O erro? Eu dizia, pois é, o erro. Eu penso, se o erro não foi de dentro, mas de fora? Se o erro não foi seu, mas da coisa? Se foi ela quem não soube estar pronta? Que não captou, que não conseguiu captar essa hora exata, perfeita, de estar pronta. Porque assim como o movimento de apanhar deve ser perfeito, deve ser perfeita também a falta de movimento, a aparente falta de movimento do que se deixa apanhar. Você me entende?"
.....
"Não é saudade, porque para mim a vida é dinâmica e nunca lamento o que se perdeu - mas é sem dúvida uma sensação muito clara de que a vida escorre talvez rápida demais e, a cada momento, tudo se perde"


."De repente, sentada no sofá, recordei tristezas, ao lado da mala cheia de defuntos que carrego, meu olfato se aguça. De repente, não mais que de repente, meu olhar se fez cansado, minha tristeza se fez única, igual ao sabor coisas perdidas no tempo, esquecidas, como uma bandeija de morangos mofados"
.....

"Então, de repente, sem pretender, respirou fundo e pensou que era bom viver. Mesmo que as partidas doessem, e que a cada dia fosse necessário adotar uma nova maneira de agir e de pensar, descobrindo-a inútil no dia seguinte - mesmo assim era bom viver. Não era fácil, nem agradável. Mas ainda assim era bom. Tinha quase certeza".

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